As técnicas bibliométricas e de science mapping são amplamente empregadas no ambiente de pesquisa para fornecer um panorama sobre o estado da arte do conhecimento científico sobre determinado tema. Estas técnicas são importantes para auxiliar o trabalho do pesquisador ao orientar a seleção do repertório bibliográfico para fundamentar a discussão teórica. Para tanto, desenvolveu-se o método Smart que tem por objetivo facilitar a análise bibliométrica e seleção de referencial teórico, materializando-se por um sistema que traga inteligência, dinamicidade e agilidade ao processo de escrita científica. A novidade da metodologia é a união de dois critérios importantes durante o processo de análise bibliométrica: a aplicação de uma métrica representativa de classificação dos documentos científicos e visuais dinâmicos estrategicamente desenvolvidos. A metodologia destaca-se por fornecer ao usuário uma experiência dinâmica de navegação e interação com os dados, inovando a forma com que os cientistas possam obter insights sobre o universo das discussões da comunidade científica. Além disso, como fator de inovação, o método é apresentado em um sistema de Business Intelligence (BI) escalável que conta com visuais contundentes, amplo repertório de análises, navegação intuitiva e atualização automatizada. O desenvolvimento foi realizado em plataforma tecnológica de vanguarda quando o assunto é informação e compartilhamento, trazendo recursos de computação em nuvem, outra novidade, para que grupos de pesquisadores possam interagir em equipes, inclusive de diferentes instituições. Além disso, não é necessário a instalação de nenhum software. As análises geradas ficarão disponíveis para consulta, a qualquer hora e local, bastando apenas um dispositivo com conexão à internet.
Introdução
Science mapping, como o próprio nome sugere, tem por objetivo mapear o panorama sobre o “estado da arte” do saber científico em determinada área de pesquisa. Bibliometria, de forma complementar, é a aplicação de indicadores matemáticos e estatísticos para medir e comparar a evolução da ciência e técnica em qualquer área de pesquisa. A análise bibliométrica engloba uma análise de desempenho da contribuição dos autores sobre determinado tema, complementada por uma análise de relacionamento entre os pesquisadores e seus temas de estudo (Donthu et al., 2021), ou seja, perpassa pela análise de indicadores numéricos e relacionamentos detectados no conjunto dos dados científicos.
As técnicas de science mapping evoluíram consideravelmente nos últimos anos graças aos avanços das ferramentas das tecnologias da informação. As primeiras discussões sobre o mapeamento da literatura científica apresentaram a importância da aplicação de softwares que pudessem realizar análises bibliométricas (Ahlgren & Jarneving, 2008; Chavalarias & Cointet, 2008; Noyons et al., 1999; Small, 1997; Soós, 2011; Soós & Kampis, 2012) unindo métricas de mensuração e visualização dos dados.
O uso das técnicas de science mapping e bibliométricas já se consolidaram enquanto prática usual já no planejamento inicial da pesquisa, quando são levantadas diversas informações bibliométricas para auxiliar a escrita científica (Aria & Cuccurullo, 2017; Murgado-Armenteros et al., 2015; Pagani et al., 2015; Pallottino et al., 2018; Rodríguez-Bolívar et al., 2018). É um método adotado para fazer um desenho científico dos temas que vêm sendo tratados, com discussões complexas e que exigem gerenciamento, visto que as técnicas de science mapping e bibliométricas são compostas por etapas sistemáticas amparadas por diferentes ferramentas de softwares, porém, cabe ressaltar que nem todas são de livre acesso (Aria & Cuccurullo, 2017).
A análise bibliométrica é um método aplicado para explorar e analisar volumes de dados, buscando por nuances evolutivas de um campo específico do conhecimento, enquanto lança luz sobre as áreas emergentes (Donthu et al., 2021). A aplicação destas técnicas bibliométricas buscam despertar insights sobre a evolução da ciência, direcionando os esforços do pesquisador a uma revisão sistemática da literatura com foco nas discussões da comunidade acadêmica sobre determinado problema, a partir da organização e sumarização das construções teóricas com base nos principais documentos científicos produzidos.
Uma metodologia desenvolvida inicialmente para a seleção de repertório bibliográfico é conhecida como ProKnow-C (Knowledge Development Process – Constructivist) (Ensslin et al., 2015) que tem por objetivo desenvolver a análise bibliométrica em 4 diferentes estágios: seleção de portfólio de publicações relevantes, análises bibliométricas descritivas como análise de métricas numéricas, revisão sistemática das publicações em função do portfólio selecionado, definição de novas questões de pesquisa com base nas etapas anteriores aplicadas. O método ProKnow-C começou a ser desenvolvido no início da década de 2000, a partir das atividades do Laboratório de Metodologias Multicritério de Apoio à Decisão (LabMCDA), na Universidade Federal de Santa Catarina no Brasil, com o objetivo de desenvolver um processo estruturado para a seleção de um referencial bibliográfico com reconhecimento científico e sua análise para um determinado assunto (Ensslin et al., 2015). Os dados podem ser manipulados em uma planilha eletrônica e recebem sucessivos filtros para que seja selecionado um conjunto de produções científicas relacionadas a determinado tema de pesquisa.
A partir do Procknow-C, Pagani, Kovaleski and Resende (2015) propuseram um método de classificação de artigos, conhecido como “Methodi Ordinatio”, que se exprime por uma métrica utilizada para fazer o ranking e classificação das produções científicas. Ou seja, além dos filtros aplicados de forma sistemática às produções científicas, agora com esta metodologia desenvolve-se uma métrica que permite a classificação das produções calculada com base nas variáveis número de citações, ano de publicação e fator de impacto das revistas. No método Ordinatio, faz-se necessário manipular os dados extraídos dos portais científicos para gerar o índice de classificação InOrdinatio. Neste caso, o usuário precisa ter conhecimento de planilhas eletrônicas para desenvolver os cálculos sugeridos pela metodologia e aplicar uma equação matemática de classificação que permita selecionar as produções científicas mais relevantes do espaço amostral selecionado.
Porém, além de uma métrica representativa para gerar classificação de importância entre os elementos amostrais extraídos dos portais científicos, faz-se importante o desenvolvimento de visualizações para ampliar a capacidade de análise bibliométrica. A neurociência comprova a importância da visualização dos dados na compreensão de determinados fenômenos, visto que as imagens ampliam a capacidade de entendimento (Dwyer et al., 2020), o que explica a importância de visualizações nos processos cognitivos. Assim, Rodríguez-Bolívar, Alcaide-Muñoz and Cobo (2018) propuseram um método de mapeamento científico para analisar a evolução de determinado tema de pesquisa, quando então foram combinadas diferentes ferramentas bibliométricas com a capacidade de identificar áreas temáticas e mostrar seus comportamentos evolutivos, empregando diferentes ferramentas de visualização já no planejamento da pesquisa.
Por conseguinte, antes mesmo de se iniciar a pesquisa é necessário um procedimento de análise de dados, organizando um fluxo de trabalho que aplique uma ferramenta de software para organização dos dados extraídos dos portais científicos, fornecendo informações visuais, como por exemplo, a proposição do método conhecido como bibliometrix (Aria & Cuccurullo, 2017). Nesta metodologia os dados extraídos dos portais científicos são processados no software R para alimentarem o sistema “bibliometrix” e gerarem informações e visualizações. O processo exige download e instalação do software R, bem como capacidade do usuário para interagir com uma linguagem de programação não tão intuitiva, o que dificulta consideravelmente o trabalho do pesquisador. O algoritmo de execução, elaborado na linguagem R, além de complexo, pode apresentar alguns problemas no processamento, sendo necessária a configuração do ambiente e execução minuciosa dos comandos. Qualquer erro de script resultará em problemas no processamento, além do que, as etapas são complexas em sua execução.
Considerando a dinamicidade do ambiente da pesquisa, bem como a necessidade de se levantar informações bibliométricas de forma ágil, ferramentas de Business Intelligence (BI) possuem ampla aplicabilidade e mostram-se poderosas para auxiliar o pesquisador, orientando melhores escolhas de repertório bibliográfico. A evolução dos sistemas de informação cresce em escala exponencial e os sistemas de BI acompanham esta trajetória ao oferecer soluções tecnológicas em sintonia com o conceito de “big data” e que conduzem a decisões assertivas fundamentadas em dado, informação, conhecimento e inteligência (Shollo & Galliers, 2016).
O termo de BI congrega em si o conceito de inteligência de negócios orientado aos processos que envolvam coleta, organização, análise e monitoramento de informações com vistas à tomada de decisão em qualquer tipo de negócio que seja centrado em análise de dados e conhecimento. De acordo com López-Robles et al. (2019), a definição de BI pode ser entendida como a coleta, análise, interpretação e disseminação de informações de alto valor sobre áreas estratégicas, que são transmitidas no momento certo aos tomadores de decisão. Fazer escolhas baseadas em informação e conhecimento é pré-requisito para sucesso de qualquer empreendimento, seja no ambiente dos negócios, seja no meio científico em que se faz cogente utilizar referencial apropriado, desde o início da pesquisa, alinhado à uma lacuna relevante.
A partir dos métodos em comento, um sistema de BI foi desenvolvido baseado no método denominado Smart com o objetivo de congregar as metodologias aplicadas por (Aria & Cuccurullo, 2017; Ensslin et al., 2015; Pagani et al., 2015) em um sistema que associe uma métrica assertiva de classificação de documentos científicos a visualizações estrategicamente desenvolvidas. A solução proposta combina as técnicas de science mapping e de bibliometria, perpassando pela manipulação automatizada dos dados, elaboração de análises visuais avançadas, com o objetivo de direcionar a seleção de referencial teórico de qualidade pelo método Smart. Esta nova metodologia almeja facilitar o trabalho do pesquisador ao automatizar diversas rotinas, não exigindo do usuário sequer conhecimento sobre manipulação de planilhas, programação em R ou mesmo download de qualquer software, além de ser de livre acesso.
Em suma, o método proposto apresenta como vantagens oferecer uma solução de acesso gratuito, com recursos de processamento em nuvem, congregando métricas representativas de seleção de referencial teórico e visuais estratégicos, interface intuitiva e amigável ao usuário, permitindo uma experiência de navegação e interação com os dados para a obtenção de insights sobre o panorama da pesquisa científica em determinado tema.
A aplicação do método Smart tem intenção de auxiliar o trabalho do cientista na automatização de diversas rotinas de manipulação de dados, materializando-se em um sistema simples, de fácil navegação e atualização, com potencial para indicar possíveis lacunas de pesquisa no universo da ciência, bem como reverter inteligência em escrita científica orientada à evolução do saber nas mais diversas áreas do conhecimento.
Resultados
o processo de Science Mapping e bibliométrico, pelo método Smart, tem potencial para automatizar processos manuais e rotineiros, trazendo uma análise mais ágil para a escolha de produções científicas relevantes de forma inovadora, simplificada e acessível. Com este sistema, o cientista terá uma poderosa ferramenta que fornecerá um conjunto de informações estratégicas que irão alavancar a probabilidade de sucesso em publicações a partir da identificação de lacunas de pesquisas relevantes. O resultado esperado para este desenvolvimento é de que esta solução possa facilitar a vida do pesquisador, ampliando a assertividade na produção científica, e de forma complementar, contribuir com a expansão dos horizontes do saber.
Referências
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